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sole-tsunamiUm equipamento brasileiro, para medições da radiação solar na faixa de frequências dos tera-hertz (1 trilhão de Hertz ou 1012 Hz), correspondente a comprimentos de onda inferiores a 1 milímetro, será enviado em breve a 40 quilômetros da superfície terrestre, em voos de longa duração a bordo de balões estratosféricos.
O experimento, denominado Solar-T, destina-se a explorar um dos aspectos menos conhecidos e mais enigmáticos da atividade do Sol. No estudo das emissões solares, a faixa dos tera-hertz (THz) do espectro eletromagnético, situada entre as micro-ondas e o infravermelho próximo, foi praticamente desconsiderada até recentemente.

“Imaginava-se que ela fosse pouco importante, abrigando eventualmente apenas a radiação proveniente de fenômenos de origem térmica. Mas descobertas relativamente recentes, realizadas nas frequências de 0,2 THz e 0,4 THz, mudaram essa concepção”, disse o coordenador do experimento, Pierre Kaufmann, do Centro de Radioastronomia e Astrofísica Mackenzie (Craam) da Universidade Presbiteriana Mackenzie, à Agência FAPESP.

As emissões em tera-hertz, associadas a explosões solares, foram detectadas pelo radiotelescópio solar para ondas submilimétricas operado em El Leoncito, nos Andes Argentinos. E, por seu ineditismo, essa descoberta causou grande perplexidade e agitação entre os cientistas.

“Ela deu início a uma década de enormes esforços teóricos e experimentais voltados para a elucidação do fenômeno. Foi por isso que dedicamos de oito a nove anos à concepção e à construção do Solar-T, em colaboração com o Centro de Componentes Semicondutores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e o Observatório Solar Bernard Lyot, de Campinas-SP”, comentou Kaufmann.

A suposição é que as emissões em tera-hertz, ou “radiação T”, como às vezes são chamadas, decorram de mecanismos de aceleração de partículas a altos níveis de energia, antes insuspeitados.

Uma das hipóteses é a de que as emissões sejam produzidas por elétrons ultrarrelativísticos [acelerados por campos eletromagnéticos até velocidades próximas à da luz]. “Outras cogitações relacionam sua origem com o decaimento de píons, produzindo pósitrons de alta energia”, disse Kaufmann.

O Solar-T, que poderá ajudar a elucidar esse mistério, é, basicamente, um sistema de fotômetros – medidores de intensidade de fótons. Ou melhor, um aparato composto por: dois fotômetros; coletores; filtros para bloquear radiações de frequências indesejáveis (infravermelho próximo e luz visível), que poderiam mascarar o fenômeno; fontes de alimentação; e sistema de telemetria, para o envio de informações à Terra por ondas de rádio, valendo-se da rede Iridium de satélites.

“O Solar-T é um telescópio quase rádio e quase óptico. Não forma imagens, como os telescópios ópticos, mas detecta e mede radiações cujas frequências situam-se entre o limite superior do rádio (micro-ondas) e o limite inferior da luz visível (infravermelho)”, resumiu Kaufmann.

A necessidade de lançar o equipamento à estratosfera se deve ao fato de a atmosfera bloquear quase toda a radiação tera-hertz recebida pela Terra. “A interpretação do mecanismo de produção da radiação T depende da maior obtenção de dados relativos a essa faixa do espectro. E a atmosfera terrestre é altamente opaca a ela”, disse.

“Em El Leoncito, conseguimos explorar duas pequenas ‘janelas’, nas frequências de 0,2 THz e 0,4 THz. Mas precisamos investigar frequências mais altas. O Solar-T vai operar em 3 THz e 7 THz e observar todo o disco solar, detectando qualquer pequena variação decorrente de explosões que venham a ocorrer em pontos localizados”, explicou Kaufmann.

A pesquisa coordenada por Kaufmann tem apoio da FAPESP por meio de Auxílios à Pesquisa Projeto Temático e Regular.

Transporte em balões

Uma alternativa ao uso de balões estratosféricos é enviar o Solar-T a bordo de satélites. Porém, se isso ocorresse, o que se tornaria “estratosférico” seria o custo do experimento.

Uma segunda opção é transportar outra versão do Solar-T a locais em grande altitude, muito secos e frios, como, por exemplo, o Altiplano do Atacama, para observar a radiação em “janelas” atmosféricas de frequências tera-hertz. Essa opção não está excluída, mas apresenta difíceis exigências de infraestrutura.

Segundo Kaufmann, o transporte em balões terá para o experimento brasileiro um custo praticamente zero. Devido ao alto impacto de artigos publicados em revistas científicas e ao sucesso de apresentações em conferências, os pesquisadores brasileiros receberam o transporte como oferta de colaboração.

“Acolhemos dois convites: um, para um voo de 7 a 10 dias sobre a Rússia, em colaboração com o Instituto de Física Lebedev de Moscou; o outro, para um voo de duas semanas sobre a Antártica, em cooperação com a Universidade da Califórnia em Berkeley”, disse.

Como esses balões gigantescos levam a bordo vários equipamentos, com cargas totais da ordem de 8 a 12 toneladas, e o aparato brasileiro pesa apenas cerca de 60 quilos, as datas de lançamento podem sofrer alterações para a compatibilização dos cronogramas dos diferentes experimentos. A missão sobre a Rússia está prevista para julho ou agosto de 2014. E a missão sobre a Antártica, para o verão 2015-2016 no hemisfério Sul, precedida de voo-teste de um dia sobre o Texas, no ano anterior.

No voo sobre a Antártica, o Solar-T será instalado junto ao experimento de raios gama GRIPS, da Universidade da Califórnia em Berkeley, que tem seu próprio sistema automático de apontamento e rastreio do Sol. O balão será lançado e recuperado na base norte-americana de McMurdo, situada na ilha vulcânica de Ross, próxima à costa antártica.

Segundo Kaufmann, o voo sobre a Rússia, lançado de Kamchatka, no extremo leste da Sibéria, e recuperado em Volgogrado, requererá uma gôndola para o rastreio automático do Sol, desenvolvida e construída em colaboração com a Universidade da Califórnia em Santa Bárbara.

“As missões do Solar-T em balões estratosféricos devem ser realizadas, necessariamente, em curto prazo, para aproveitar, nos próximos poucos anos, a fase cíclica de intensificação da atividade solar, na qual as explosões se tornam mais frequentes”, disse Kaufmann.

Agência FAPESP