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Ciência e Tecnologia
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A descoberta não é tão fácil de entender, mas promete ter grande utilização em um futuro próximo. Tem a ver com quiralidade, magnetismo e transparência, relação que já vinha sendo estudada, mas que acaba de ganhar novos contornos, a partir de trabalho de pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e da Universidade de Michigan. O grupo inovou ao utilizar um aminoácido quiral na síntese de um material paramagnético.
Os resultados foram publicados em uma das revistas científicas de maior prestígio no mundo: a Science.

O cientista inglês Michael Faraday já havia demonstrado em 1845 que o campo magnético de um ímã podia mudar a interação de qualquer material com a luz, fazendo o feixe de luz girar sobre seu próprio eixo, semelhante ao que se observava, na mesma época, para certas substâncias chamadas quirais. O desafio dos estudiosos foi, desde então, buscar materiais que tivessem, ao mesmo tempo, as propriedades de quiralidade e de magnetização, e com isso conseguir fazer o material opaco ficar transparente usando um campo magnético.

O trabalho dos pesquisadores da UFSCar e de Michigam caminhou, justamente, nessa direção. Durante a pesquisa, a síntese e a caracterização das nanopartículas de óxido de cobalto na fase espinélio (dois tipos de oxidação diferentes) foram realizadas na Universidade de Michigan. Esse material já vinha sendo estudado em razão de suas propriedades magnéticas. Entretanto, o diferencial da pesquisa recém publicada na Science foi a presença, na síntese, da cisteína, um aminoácido com propriedades quirais. Os experimentos confirmaram que as moléculas de cisteína transferiram a quiralidade para as nanopartículas cerâmicas; e a quiralidade permaneceu mesmo com a remoção do aminoácido.

A próxima fase foi a modelagem computacional, realizada na UFSCar com o uso do supercomputador brasileiro SDumont (LNCC/MCTI). Essa etapa foi feita com o intuito de demonstrar de maneira detalhada e precisa onde e como as moléculas de cisteína e as nanopartículas de óxido de cobalto se ligam, bem como descrever como essas estruturas vibram e se movem e como os elétrons se reorganizam quando a luz é absorvida. Para isso, foram feitas duas varreduras da estrutura, uma com e outra sem a presença da cisteína na superfície das nanopartículas, o que comprovou a transferência de quiralidade. "A modelagem serve para explicar como a quiralidade pode ser induzida e quais propriedades podem ser controladas dessa maneira", explica André Farias de Moura, docente do Departamento de Química (DQ) da UFSCar e pesquisador do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF/Cepid/Fapesp).

Além de Moura, assinam o artigo "Chiromagnetic nanoparticles and gels" - que levou três anos para ser desenvolvido e foi publicado na Science em 19 janeiro - Jihyeon Yeom, Uallisson S. Santos, Mahshid Chekini, Minjeong Cha e Nicholas A. Kotov.

Aplicações
Os resultados publicados no artigo levam à investigação de outras cerâmicas com propriedades magnéticas e outras moléculas quirais, otimizando, assim, o controle da transparência do material na presença de campos magnéticos e sua atividade catalítica na presença de luz. Também abre um novo leque de possibilidades de aplicações tecnológicas.

Pelo fato de ser capaz de mudar o material de opaco para transparente e vice-versa, prevê-se que seja possível ligar e desligar a conexão entre duas fibras ópticas transmitindo dados ou reações químicas que dependem de luz.

Por tratar de nanopartículas de baixo custo e que funcionam em temperatura ambiente, os estudos podem permitir a produção em massa de monitores em 3D, bem como de projetores holográficos e uma nova geração da Light Detection And Ranging (Lidar), uma técnica óptica que mede propriedades da luz refletida, de modo a obter a distância e/ou outra informação a respeito de um determinado objeto. Essa tecnologia poderá dar "visão" a veículos autônomos.

Outra aplicação possível é na área da Saúde. Como as nanopartículas são revestidas com molécula biológica, o material é compatibilizado a entrar em um organismo vivo, podendo ser ajustado para atacar invasores sem prejudicar as células humanas. Além disso, poderá permitir o aumento do controle em terapias fotodinâmicas para doenças como o câncer.

A continuação da pesquisa tem como foco a construção de uma biblioteca de nanopartículas quirais diversas, as quais serão usadas como blocos de montagem para estruturas maiores e mais complexas, e a mudança de escala de nano para mesopartículas.

O artigo completo pode ser conferido no número da revista Science de 19 janeiro de 2018, volume 359, páginas 309-313, em http://bit.ly/2FlCeHT.