Submit to FacebookSubmit to Google PlusSubmit to TwitterSubmit to LinkedIn
Pacientes com câncer costumam ser considerados curados quando, após o término do tratamento, permanecem mais de cinco anos sem recaída. Em alguns casos, porém, o tumor reaparece no mesmo local depois desse período e levanta a dúvida entre os médicos: será uma recidiva ou uma nova lesão? A resposta pode ser determinante na avaliação do prognóstico e no planejamento da terapia.
Por esse motivo, pesquisadores do Hospital A. C.Camargo trabalham no desenvolvimento de uma metodologia capaz de diferenciar com precisão as duas situações.

Coordenado por Luiz Paulo Kowalski, o projeto foi um dos ganhadores na primeira edição do Prêmio Professor Ricardo Renzo Brentani, criado pelo hospital para homenagear o médico e pesquisador que foi presidente da Fundação Antônio Prudente (que mantém o Hospital A.C.Camargo), com o objetivo de incentivar seu corpo clínico a se dedicar às pesquisas na área de oncologia.

“Por uma simples questão de classificação, costumamos considerar esses casos como recorrência do câncer. Mas não tem muita lógica um tumor ficar tanto tempo aquiescente e depois voltar. A suspeita é que algumas dessas voltas tardias sejam, na verdade, células normais que sofreram mutação e deram origem a novos tumores”, explicou Kowalski.

Segundo o médico, que dirige o Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço e Otorrinolaringologia do A.C.Camargo, a proposta é usar técnicas de biologia molecular para analisar o perfil de expressão gênica dos tumores.

“Se for de fato uma recidiva, o perfil de expressão gênica deverá ser muito parecido com o do tumor original. Se for uma nova lesão, o perfil será diferente”, explicou.

Os pesquisadores pretendem comparar três grupos de amostras de tumores do tipo carcinoma epidermoide de boca. No primeiro grupo estão os casos em que há certeza de se tratar de um segundo tumor primário, uma vez que a lesão apareceu em outro local.

Nas amostras do segundo grupo há a certeza de que se trata de uma recidiva, pois o tumor reapareceu no mesmo local em menos de cinco anos após o tratamento. No terceiro grupo estão os casos de recorrência tardia no mesmo local, que podem deixar os especialistas em dúvida.

“Vamos avaliar o perfil de expressão gênica nas amostras e comparar entre os grupos. Queremos saber quais genes estão mais expressos, quais estão suprimidos e por quê. Isso pode trazer informações sobre a origem do tumor e seu potencial de crescimento. Como as amostras são de casos antigos, podemos comparar os resultados com o desfecho da situação clínica do paciente”, explicou Kowalski.

Controle de qualidade

Outro projeto selecionado na primeira edição do Prêmio Professor Ricardo Renzo Brentani tem o objetivo de criar um método para analisar a qualidade de amostras armazenadas em banco de tumores. Esses tecidos são matéria-prima para pesquisas que buscam, por exemplo, marcadores genéticos que ajudem a avaliar a agressividade de tumores e a prever como será a resposta ao tratamento.

“As amostras são coletadas e guardadas de maneira a minimizar as chamadas variações pré-analíticas, provocadas na etapa de aquisição do tecido. No caso de tecidos humanos, um fator pré-analítico importante é o tempo decorrido entre a sua retirada do paciente e o congelamento da amostra. Não se sabe com certeza o quanto esse chamado tempo de isquemia fria provoca alterações no material. Se as alterações forem profundas, isso deve ser levado em conta na hora de usar a amostra em projetos de pesquisa”, explicou o patologista Antônio Hugo José Froes Marques Campos, coordenador da pesquisa.

Segundo Campos, o projeto tem o objetivo de descobrir se uma amostra que ficou 10 minutos aguardando congelamento tem características moleculares diferentes de uma amostra que ficou 60 minutos à espera do procedimento.

“Se encontrarmos diferenças profundas, poderemos estabelecer com mais segurança um tempo limite para a aquisição de amostras de tumores para pesquisas em câncer. Se não houver diferenças significantes, os protocolos podem ser mais maleáveis, o que gera um impacto positivo na rotina de um centro cirúrgico, sempre muito atribulada”, disse Campos.

O projeto tem uma primeira etapa experimental que será feita em camundongos sadios com o objetivo de descobrir quais genes são modificados ao longo de diferentes tempos de isquemia fria em órgãos pré-selecionados. Posteriormente, os pesquisadores pretendem validar os achados em amostras de tumores armazenadas no Biobanco do Hospital A. C.Camargo.

“Se os achados forem relevantes, um teste de qualidade pode ser proposto para amostras de tecidos que forem criopreservadas com finalidade de pesquisa. Isso pode ser aplicado em nossa instituição ou em outras que tenham ou pretendam ter biobancos similares ao nosso”, disse Campos.

Os projetos coordenados por Kowalski e por Campos foram premiados com R$ 100 mil cada. Também foram selecionadas as pesquisas lideradas por Marcus Duarte (R$ 50 mil), Hirofumi Iyeyasu (R$ 50 mil), Maria Dirlei Ferreira de Souza (R$ 50 mil), Samuel Aguiar Junior (R$ 50 mil), Rubens Chojniak (R$ 50 mil), Wesley Andrade (R$ 30 mil) e Vítor Piana de Andrade (R$ 20 mil).

Homenagem

Além de prestar uma homenagem a Ricardo Brentani, considerado um dos principais responsáveis por transformar o A.C.Camargo em referência na área de pesquisa em câncer, a premiação também tem o objetivo de apoiar projetos que não se encaixam nos critérios das agências de fomento, segundo explicou a diretora do Centro Internacional de Pesquisa do Hospital A.C.Camargo (Cipe), Vilma Regina Martins.

“Alguns projetos são muito inovadores ou muito iniciais. Outros podem dar origem a patentes, então a instituição decidiu apoiar”, disse.

De acordo com Ademar Lopes, diretor de Cirurgia Pélvica, vice-presidente do hospital e membro da banca examinadora, a seleção levou em conta principalmente a originalidade do projeto, sua exequibilidade e a possibilidade de uma aplicação prática dos resultados obtidos.

“O A.C.Camargo é umas das instituições do país com maior produção científica em oncologia. Foi Brentani quem promoveu essa transformação e deixou uma estrutura muito sólida para a continuidade. Deixou um centro de pesquisas bem formado, um corpo clínico bem integrado com a área básica. Nossa produção científica vem se mantendo ou até aumentando”, disse Lopes.

Brentani morreu no dia 29 de novembro de 2011, aos 74 anos. Na época, era presidente da Fundação Antônio Prudente, diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo da FAPESP e coordenador do Centro Antonio Prudente para Pesquisa e Tratamento do Câncer, um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP. As pesquisas sobre câncer lideradas por Brentani tiveram impacto mundial, tonando-o uma referência na pesquisa na área.

Agência FAPESP